Recuperação pós operatória do joelho

O Uso do Biofeedback Eletromiográfico para o Pós Cirúrgico do Quadriceps Femoris Recuperação Muscular

Vanessa Draper, Ph.d. Traduzido por Ivo Oscar Donner, Psy, M.A.


Introdução

Em seguida a uma reconstrução do ligamento anterior crucial (LAC), a imobilização e/ou o desuso do membro operado pode resultar em uma atrofia significativa do músculo quadríceps femural (QF) e certamente irá resultar em fraqueza nos primeiros dias ou até mesmo nas primeiras semanas (1).

O foco dos programas de reabilitação é, portanto, a recuperação da força e da função do músculo QF (figura 1). Os exercícios de reabilitação na fase inicial do tratamento incluem, tipicamente, o ajustamento do músculo QF e o aumento contínuo da extensão da perna. Freqüentemente esses exercícios são difíceis de serem realizados durante as primeiras semanas do pós operatório devido à dor, edema, e a possibilidade de ruptura na atividade normal do receptor do ligamento (2,3).

Se o feedback do receptor da junção é distorcido, as influências facilitadoras e inibidoras deste feedback sobre a musculatura da junção são distorcidos também e os modos de contração normal da musculatura se tornam irregulares e pouco efetivos. Isto pode impedir a performance dos exercícios reabilitativos e a recuperação do controle e da força musculares.

Vários autores têm sugerido que o biofeedback eletromiográfico (EMG) pode ser uma forma valiosa de aumentar o feedback do receptor da musculatura do joelho durante os exercícios de recuperação do QF (4,5,6e7). Através de eletrodos de superfície a atividade do QF é monitorada durante os exercícios e convertida em sinais visuais e auditivos.

Enquanto o paciente pode não estar apto a "sentir" ou perceber a atividade muscular, ele pode ver e ouvir os resultados de seus esforços para contrair o músculo. O biofeedback tem se mostrado um facilitador de melhoras clínicas significativas na reabilitação pós cirúrgica da mão (8), instabilidade da junção do ombro (9), reabilitação de ferimento ou impacto da coluna vertebral (10,11), recuperação de meniscos operados (12) e recuperação do QF que se segue à reconstrução do LAC (13,14).

Biofeedback eletromiográfico (EMG) e recuperação do quadríceps femural (QF):

A recuperação da força do músculo QF após a reconstrução do LAC requer em primeiro lugar que o paciente recupere o controle voluntário do músculo de modo que exercícios de fortalecimento possam ser feitos efetivamente. O biofeedback é utilizado para reeducar o paciente nas contrações voluntárias do QF, dando a ele uma informação imediata sobre a correção de seus esforços durante o ajustamento e extensão da perna. Esta informação não somente aumenta a percepção de um feedback distorcido ou diminuído dos receptores da junção mas, adicionalmente provê um elemento motivacional. Quanto mais queixoso o indivíduo se apresenta com relação ao problema, mais motivado ele estará para traçar metas e esforçar-se para atingi-las.

Quando se dá ao paciente uma representação auditiva e visual de atividades musculares, que de outra forma ficariam encobertas ou mascaradas, e uma meta qualitativa, a ser alcançada, os esforços para executar os exercícios, e os resultados, são salientados.

Programa de Tratamento

Os pacientes devem começar a trabalhar com o biofeedback o mais rápido possível após a cirurgia. Tipicamente pede-se ao paciente para executar um ajustamento do QF e uma extensão da perna um dia após a cirurgia e pode-se iniciar o tratamento de biofeedback neste momento.

Usando o sistema MyoTracTM de EMG

Aparelho MyoTrac é uma fonte de feedback que permite ao paciente monitorar a precisão e intensidade de cada contração muscular (Fig. 2 e 3). Os ajustes variáveis do equipamento permitem ao terapeuta monitorar o progresso e estabelecer metas futuras para o paciente. Para desenvolver um plano ótimo de reabilitação, será necessário determinar o nível de ativação que o músculo quadríceps operado é capaz de produzir após a cirurgia. Antes da primeira sessão de leitura, vários ajustes devem ser feitos à unidade como se segue:



  • Escolha "X1" para a leitura de escala para utilizar o nível primário de 0 a 20 mV.
  • Ajuste a chave de treshold para contínuo de modo que permita ao paciente ver e/ou ouvir as mudanças na atividade muscular durante os exercícios.
  • Ajuste o "treshold" e o "abv" (quando aplicável), para fornecer somente feedback visual até que o nível de treshold (LED amarelo) tenha sido excedido.
  • Conecte o sensor ao local apropriado e fixe o eletrodo como se segue:
  • Com a perna estendida coloque o eletrodo de 3 a 5cm acima da borda superior da rótula e a 2 a 3cm do seu centro (Fig.1). A cicatriz da incisão irá determinar o local exato de colocação, mas a meta é focar a atividade do mecanismo extensor durante o ajuste do QF e a extensão da perna. O eletrodo deve ser fixado no local. Muitos terapeutas acreditam que os eletrodos triodos auto-adesivos proporcionam ótimas leituras, contudo devem ser tomados cuidados para evitar irritações em áreas que ainda estejam muito sensíveis.

Figure 3.

Técnica para treinamento com EMG

O paciente é treinado em primeiro lugar a utilizar o biofeedback com o exercício de ajuste do QF. Com o paciente deitado, a perna afetada estirada sobre a mesa e o eletrodo colocado, cheque os LEDs do MyoTrac enquanto o paciente relaxa o QF. Se nesta posição os LEDs vermelhos estiverem acesos ajuste o botão de treshold no sentido contrário aos ponteiros do relógio até que os LEDs verdes sejam ativados. Se o ajuste mais alto do treshold não conseguir mover os LEDs da área vermelha para a área verde, mude a chave interna de ajuste do treshold para "X10", volte o treshold para 0,5 e reveja os LEDs.

Repita este procedimento usando "X100" se for necessário. Quanto mais avançada for a atrofia muscular, tanto mais baixos serão os ajustes de treshold requeridos. Uma vez que tenham sido estabelecidos os ajustes apropriados, o paciente pode iniciar os exercícios de fortalecimento do QF.

Iniciando com os LEDs na faixa verde, o paciente deve iniciar o ajuste do QF enquanto olha para as luzes e/ou ouve o sinal auditivo do MyoTrac. Pode ser necessário um esforço máximo para ativar os LEDs vermelhos. Através do reajuste dos parâmetros, a dificuldade de cada exercício pode ser aumentada ou diminuída de acordo com a necessidade do paciente. É importante salientar, contudo, que a importância reside na qualidade da contração e não em sua quantidade.

· paciente pode ter dificuldade em iniciar uma contração, vários incentivos verbais poderão ajudar. Frases do tipo "pressione a parte de trás do seu joelho na direção da mesa" ou "force a parte anterior do seu joelho para cima e o seu pé para baixo" podem e devem ser utilizadas. Uma vez que atividade suficiente tenha sido gerada para ser registrada e mostrada pela unidade de biofeedback, este sinal pode ser utilizado para guiar os esforços de contração seguintes (O MyoTrac irá detectar uma escala de .08 a 2000 uV e, em nossa experiência, a maioria dos pacientes no pós operatório irão iniciar o registro em aproximadamente 10-20 uV). O paciente deve estar apto a realizar 3 conjuntos de 10 ajustamentos de QF, que satisfaçam ao terapeuta, antes de prosseguir para o próximo passo do programa de modo a evitar uma técnica imprópria.

Para que o biofeedback seja utilizado como uma ferramenta de treinamento, metas de níveis de atividade devem ser traçadas e alcançadas antes de se tentar metas maiores. O erro que a maioria dos pacientes comete durante os esforços iniciais para contrair o QF e fortalecer a perna é contrair simultaneamente os músculos do tendão ferido de maneira compensatória. Enquanto o paciente pode se sentir realizando um esforço suficiente para fortalecer o membro, a atividade mínima registrada no QF e mostrada pela unidade de biofeedback irá torná-lo consciente de que os esforços estão sendo feitos com o grupo errado de músculos. Nós encontramos muitos terapeutas que ensinam a contração como uma maneira de fortalecer o joelho após a cirurgia. Mesmo com contração simultânea, contudo, o QF deve ser contraído de maneira eficiente para que a extensão do joelho aconteça. O biofeedbak pode ser facilmente adaptado para este exercício. Seria interessante também utilizar um instrumento de dois canais ou dois instrumentos de um canal nesse caso, e monitorar tanto a atividade do grupo de músculos do tendão operado quanto o QF durante a extensão do joelho.

Uma vez que o biofeedback pode ser usado satisfatoriamente no exercício de ajuste da força do QF, o paciente pode usá-lo para o aumento contínuo da extensão da perna. Este exercício é realizado em posição de supino com a perna estendida. Primeiro o paciente ajusta a força do QF e então levanta a perna aproximadamente 30cm do chão ou da mesa e mantém esta posição por 5 segundos (figura 4).

Monitorando os LEDs durante cada exercício de extensão da perna o paciente estará apto a saber a qualidade da contração do QF. O QF deve estar ajustado sem evidência de falha do extensor durante o exercício. Monitorar este exercício com biofeedback faz com que o paciente esteja mais atento a mudanças na atividade da unidade motora do QF durante o tempo em que mantém a perna erguida, e fique mais apto a manter uma contração constante e completa durante as repetições do exercício.


Figure 4.

Conclusão

Em nossa experiência o biofeedback é mais útil durante as 2 a 4 semanas após a reconstituição do LAC. Nós sugerimos que ele seja utilizado com o ajustamento do QF (3 conjuntos de 10 repetições 3 vezes ao dia) e extensão da perna (3 conjuntos de 10 repetições 3 vezes ao dia; adicionando de 1 a 5 Kg de peso, progressivamente, conforme tolerado). O treshold deve ser ajustado de maneira a exigir o máximo esforço do paciente para atingir a meta. Os pacientes devem ser encorajados a aumentar o treshold tão rápida e regularmente quanto possível; de outra maneira o biofeedback torna-se somente um equipamento de monitoração e não uma ferramenta de treinamento. É importante lembrar ao paciente que os valores absolutos de microvoltagem podem variar de acordo com o grau do edema presente ao redor do ponto de colocação do eletrodo bem como com a colocação na localização exata. Os pacientes podem ser encorajados ou desencorajados falsamente se se basearem demais nos valores absolutos. Os valores, contudo, serão relativos à precisão e intensidade dos esforços do exercício e esta informação pode ser de valioso auxílio, bem como motivadores para o paciente que está recuperando o joelho pós operado. Quanto mais feedback o paciente recebe sobre a qualidade de sua contração muscular, mais controle ele terá sobre o retesamento muscular, e portanto estará mais motivado a continuar a terapia. O biofeedback tem provado ser a chave que dá ao fisioterapeuta informações importantes sobre o progresso do paciente, assim como auxilia o paciente a monitorar seu próprio sucesso.

REFERÊNCIAS

  1. Noyes FR, Mangine RE, Barber S: Early knee motion after open and arthroscopic anterior cruciate ligament reconstruction. Am J Sports Med 15:149-159, 1987.
  2. deAndrade JR, Grant C, Dixon A St. J: Joint distension and reflex muscle inhibition in the knees. J Bone Joint Surg (Am) 47:313-322, 1965.
  3. Krebs DE, Staples W, Cuttita D, Zickle R: Knee joint angle, It's relationship to quadriceps femoris muscle activity in normal and post-arthrotomy limbs. Arch Phys Med Rehabil, 64:441-447,1983.
  4. Soderberg GL, Minor SD, Arnold K et al: Electromyographic analysis of knee exercises in healthy subjects and in patients with knee pathologies. Phys Ther 67: 1691-1696, 1987
  5. Hald RD, Bottjen EJ: Effect of visual feedback on maximul and submaximal isokinetic test measurements of normal quadriceps and hamstrings. Journal of Orthopedic and Sports Physical Therapy 9:89-93, 1987
  6. Delitto A, Rose SJ, McKowen JM, Lehman, RC, Thomas JAS, Shively RA: Electrical Stimulation versus voluntary exersise in strengthening thigh musculature after anterior curciate ligament surgery. Phys Ther 68:660-663, 1988.
  7. Lucca JA, Recchiutu SJ: Effect of electromyograhic biofeedback on an isometric strengthening program. Phys Ther 63:200-203, 1983.
  8. Brown DM, Nahai F: Biofeedback strategies of the occupational therapist in total hand rehabilitation. In Basmajian JV(ed): Biofeedback: Principles and Practice for Clinicians. Baltimore, MD, Williams and Wilkins, 1983, pp 90-106.
  9. Beall MS, Diefenbach G, Allen A: Electormyographic biofeedback in the treatment of volunteer posterior instability of the shoulder. Am J Sports Med 15: 175-178, 1987.
  10. Nacht MB, Wolf SL, Coogler CE: Use of electromyograhic biofeedback during the acute phase of spinal cord injury. Phys Ther 62: 290-294, 1982.
  11. Wolf SL: Electromyographic applications to stroke patients: A critical review. Phys Ther 63: 1448-1459, 1983.
  12. Sprenger C, Carlson K, Wessman H: Applications of electromyographic biofeedback following medial menisectomy. Phys Ther 59: 167-169, 1979.
  13. Draper V: Electromyographic biofeedback and the recovery of quadriceps femoris muscle function following anterior cruciate reconstruction. Phys Ther 70: 11-17, 1990.
  14. Draper V, Ballard L: Electrical Stimulation versus electromyographic feedback in the recovery of quadriceps femoris muscle function following anterior cruciate ligament surgery. Phys Ther 71: 455-464, 1991.

 

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